NÃO
VOU FALAR DE POLÍTICA
Tenho
ouvido e lido a expressão “não vamos falar de política” com cada vez mais
frequência e evidente irritação de quem diz. Curiosa negação vinda justamente
quando a política arde aos olhos de quem vê tudo que se passa neste país
beligerante. Tanto me disseram que assumo o “não”. Não vou falar de política.
Vou falar porque motivo não aceito Bolsonaro e o bolsonarismo emergente neste
momento triste da vida nacional. Eu teria de fato mil razões políticas para
falar, mas tenho mil e uma outras razões para sentir em mim a ojeriza a tudo
que estamos passando. Venho, portanto, agora a falar, não de política, mas de
humanidade.
É
de minha natureza, contra que não pretendo lutar, acreditar que as pessoas
mereçam a liberdade de ser, de pensar e de sentir. Não concebo razões para que
qualquer pessoa seja discriminada, violentada e excluída de qualquer direito
humano seja porque motivo for. Não importam suas orientações ideológicas,
religiosas ou sexuais. Tampouco a condição social e de gênero, ou cor. Nada
justifica uma injustiça contra quem quer que seja. Sequer aspiro à justiça
movido por princípios religiosos: não são as minhas crenças ou preceitos
religiosos que me orientam sobre o que considero o bem e a bondade. Em minhas
concepções de mundo, a ética prescinde de crenças ou mesmo jurisprudências. Não
é necessariamente a lei que se me impõe. Mas me rejo pelos princípios morais
solidificados em mim. Creio na liberdade, creio na vida, creio na igualdade de
direitos e oportunidades.
Jamais
conseguiria, por isso, defender a ditadura, a censura do pensamento, ou morte
de quem quer que seja. Jamais verei a opressão, a fome dos necessitados, o
desdém e a violência contra pobres, pretos, gays, índios, mulheres, sem
tomar-me de indignação e revolta. Minha fé é deste mundo, plena de humanidade.
Não aspiro ao que transcende nem busco minha salvação. Busco um mundo pacífico,
solidário, e humanista, em que maior que a pátria seja a justiça entre os
homens. Sei que em função de minhas convicções apontar-me-ão o dedo da
acusação a gritarem-me: esquerdista! Comunista!... como não o ser? Se
esquerdista e comunista significa a muitos hoje em dia, sem qualquer
conhecimento crítico e histórico do sentido destes conceitos, acreditar que o
bem comum é possível e que a sociedade pode ser mais justa, mais humana, sem
oprimir, sem explorar ou submeter qualquer pessoa a condições degradantes e
humilhantes, assumo de bom grado o que para alguns é uma ofensa.
Justamente,
em função deste meu sentimento de mundo, o que vejo hoje emblemado na figura de
Bolsonaro e de seu séquito é o oposto do que acredito como humanismo ou mesmo o
que aspiro à humanidade. Não vou discutir o que subjaz nos bastidores do poder
a justificar a sua eleição, tampouco discuto agora o projeto político a que ele
serve, contrário aos interesses trabalhistas, ambientais e sociais, mas renego
justamente o discurso anti-humanitário. Eu jamais optaria por seguir alguém
cujo signo mais forte fosse uma arma e cujo discurso incitasse em mim o crime e
o assassinato, movido por um desejo de vingança e uma fúria no gesto e no
olhar. Em todas as ocasiões públicas de Bolsonaro, foi sempre este emblema que
se elevou. A mesma coisa percebo em seus seguidores: há um ódio latejante em
cada fala, em cada gesto e cada olhar.
Na
oratória de Bolsonaro, há um discurso do não gritante. Não se trata de uma
negativa no sentido de pôr em xeque um pensamento e dar vazão a que circule a
corrente do entendimento. Mas simplesmente um “não” cortante e ameaçador, um
não grávido de morte. Não se discute o contraditório, agride-se veemente o
pensamento contrário. O único sim que se destaca em sua fala, pela importância
histórica, foi justamente aquele que votava pelo impeachment da presidenta
Dilma. Todavia, justamente esse sim negava a civilidade, a empatia, a
solidariedade, e qualquer traço de humanidade justamente ao dedicar seu voto à
tortura e ao torturador, apontados como o terror daquela mulher, e por que
seria um terror se não representasse a dor? Seu único sim foi uma exaltação à
desumanidade, à barbárie, ao estupro, à crueldade, à degradação e à morte. Fora
isto, suas falas impõem que se calem todos, que parem, que matem, que morram,
que se destrua, que acabe, que extermine. O que se implanta neste momento no
Brasil é um signo de morte, a semear a discórdia e oprimir o diferente. Não
serei o poeta deste mundo imundo. Minha natureza alia-se à beleza da vida e à
grandeza da justiça: não há vida onde imperem a dor e o sofrimento; não há
justiça onde não há humanidade.
Edilberto
C. – Educador Sim/RN
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Nasce preocupado com os caminhos do proletariado em geral, porém, especialmente, com o brasileiro