quarta-feira, 29 de março de 2023

Americanismo decadente para o século 21 * Juan J. Paz E Miño Cepeda/LaPluma

Americanismo decadente para o século 21


Nesse processo, os latino-americanos não estão dispostos a consentir ou aderir à nova e maniqueísta divisão da humanidade em uma esfera de países e governos "livres" e "democráticos" e outra de governos "autoritários", embora seja ainda difícil alcançar uma geoestratégia comum que se torne uma força continental decisiva.

Juan J. Paz E Miño Cepeda 27 de março de 2023

Duzentos anos atrás, a América Latina era a região do continente que iniciava uma nova era histórica entre a independência anticolonial e a construção dos Estados Nacionais. Momento decisivo, cheio de contradições. No solo actuaban las fuerzas sociales despertadas en los diferentes países por las independencias, sino que se redefinían los poderes mundiales, ante el derrumbe del imperio español y el ascenso de otras potencias capitalistas en Europa (ante todo Inglaterra), así como de los Estados Unidos na América.


No ano de 1823, uma série de eventos ocorreu. Em Buenos Aires foi assinada a aliança com a República da Colômbia para garantir a independência; mas em Montevidéu foi acertada a defesa contra o avanço do Brasil, ainda sob Pedro I; e no Chile Bernardo O'Higgins renuncia. A incipiente Colômbia autorizou o Libertador Simón Bolívar a empreender a Campanha do Sul , o que lhe permitiu transladar e travar as batalhas de Junín e Ayacucho (1824), que deram a independência definitiva ao Peru e à Bolívia, embora houvesse um setor que apoiasse um reino independente com um príncipe espanhol. A América Central estava em alvoroço: no México pôs fim ao império Iturbide , enquanto Guatemala, Honduras, El Salvador, Nicarágua e Costa Rica decidiram estabelecer o"República Federal da América Central" , o que também implicava libertar-se de qualquer controle do México. No Caribe, os patriotas cubanos tentaram uma expedição de libertação do México e principalmente com o apoio de Simón Bolívar, conseguindo um avançado projeto de independência conhecido como "Sóis e Raios de Bolívar" , embora sem sucesso, pois a ilha só poderia tornar-se independente em 1898.


Mas o mais significativo na ordem continental foi a proclamação do presidente americano James Monroe (2 de dezembro de 1823) diante das evidentes projeções de interesses europeus, que ameaçavam a independência e segundo as quais "a América é para o povo americano ". A “Doutrina Monroe”, assim sintetizada, foi, por enquanto, um freio às tentativas de recolonização dos países latino-americanos, mas garantiu, desde o início dos Estados-nação da região, a expansão dos interesses estadunidenses. , entre 1823 e 1898 o que existiu foi um americanismo imperfeito , porque não impediu as incursões europeias (especialmente da Inglaterra e da França) na América Latina.

Precisamente por essa experiência histórica, em 1895, o caudilho liberal-radical equatoriano Eloy Alfaro (1842-1912) convocou um congresso continental que se reuniria no México em 10 de agosto de 1896. Esse congresso foi boicotado pelos Estados Unidos, por meio do Secretário de Estado, Sr. Olney. Conseqüentemente, apenas os representantes de oito Estados participaram da reunião: Costa Rica, Equador, El Salvador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua e República Dominicana. Acordou-se contundente relatório, que não só revisava as incursões européias e norte-americanas em diferentes países latino-americanos ao longo do século XIX, mas também, pela primeira vez, postulava a necessidade de submeter a Doutrina Monroe a um verdadeiro direito público americano. , aprovado por todos os países. Fechou assim, com uma crítica radical,


A nova diplomacia do presidente dos Estados Unidos, Theodore Roosevelt: "Ele fala suavemente e carrega uma vara grande", cartoon político de Puck (Londres), 1901

No início da era do imperialismo contemporâneo, o monroísmo tornou-se expansivo, tendo como referencial de comportamento tanto a doutrina do "big stick" do republicano Theodore Roosevelt (1900), quanto a do "bom vizinho" do democrata Franklin D. Roosevelt (1933-1945). A guerra Fria, escalado após o fim da Segunda Guerra Mundial, incentivou um “americanismo” fanático, que maniqueísticamente dividiu o mundo entre o campo dos países “livres” e “democráticos” e o dos “comunistas” e “autoritários”. Outro ciclo se iniciou na década de 1980, em que deslanchou o neoliberalismo, que durante a década de 1990 se consolidou no quadro da globalização transnacional liderada pelos Estados Unidos diante do colapso do socialismo soviético. Tanto a economia de mercado quanto as democracias liberais haviam triunfado e tudo parecia “o fim da história” (F. Fukuyama).


Paradoxalmente o encantotratamento foi de curta duração. No início do século XXI incubaram-se situações imparáveis: a recuperação e ascensão da Rússia, a ascensão da China, as novas relações económicas da América Latina com esses países e a sua diversificação com outros. Para a segunda década do século XXI, o mapa-múndi tomou rumos inesperados: a crescente esclerose da hegemonia dos Estados Unidos no mundo, que arrasta para baixo as potências europeias; a definição de políticas soberanas entre os governos latino-americanos progressistas; as reações na África contra as antigas metrópoles coloniais. Como nunca antes, a crítica radical à OEA está se espalhando na América Latina, questões de intervencionismo dos EUA nos assuntos internos dos países, a recusa de alinhamento com o Ocidente na guerra da Ucrânia (apesar de posições como a do presidente Gabriel Boric no Chile), a reaproximação com a Rússia e a China, que não são consideradas potências “inimigas”. De fato, a relação entre a Rússia e a China, estabelecida após a recente visita do presidente Xi Jinping a Vladimir Putin, marca um momento histórico no desenvolvimento da humanidade. Ao mesmo tempo, fortalecem-se os BRICS e a aproximação da Argentina, que também busca o relançamento da UNASUL; enquanto o Brasil estreita relações com a China e o presidente Lula da Silva viaja para discutir assuntos de interesse. A causa de Cuba prevalece contra a agressão do bloqueio norte-americano e no México o presidente Andrés Manuel López Obrador define contundentes posições latino-americanas, confrontando diretamente os Estados Unidos.


Geral Laura J. Richardson

200 anos depois de sua proclamação, a Doutrina Monroe é insustentável e está em crise. Mas não a agressividade com que ainda se manifesta e que recentemente se tornou visível com as declarações do general Laura J. Richardson, comandante do Comando Sul dos Estados Unidos, contra a aproximação soberana da América Latina com a China e a Rússia. das agências de notícias russas na região, bem como as previsões que faz sobre os recursos naturais existentes (especialmente o lítio) e a perturbadora relação que procura renovar e fortalecer diretamente com as Forças Armadas, sobre as quais existe bastante experiência histórica.

A América Latina vive um momento de agudas contradições, como há duzentos anos, em que pesam as forças internas de cada país e, ao mesmo tempo, as geoestratégias do mundo em transformação, em meio à inevitabilidade de relações internacionais multipolares e multiculturais, que projetam o Mundus Novus do século XXI. Nesse processo, os latino-americanos não estão dispostos a consentir ou aderir à nova e maniqueísta divisão da humanidade em uma esfera de países e governos "livres" e "democráticos" e outra de governos "autoritários", embora seja ainda difícil alcançar uma geoestratégia comum que se torne uma força continental decisiva.

Juan J. Paz e Miño Cepeda para La Pluma, Equador, 27 de março de 2023

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terça-feira, 21 de março de 2023

O FASCISMO QUER RESSURREIÇÃO * Observatório Proletário / Brasil

O FASCISMO QUER RESSURREIÇÃO
NOTA
Não tenhamos dúvidas de que o nazismo, disfarçado de mil e uma maneiras, inclusive como "bolsonarismo", sempre tentou ressuscitar-se. Desde seu seu mais antigo "cemitério" chamado Europa, onde já foi enterrado diversas vezes, ele não encontra repouso suficiente, graças às exigências que seu dono - O CAPITALISMO - lhe faz o tempo todo, para manter o ritmo da máquina de calcular na checagem dos dividendos. Só por isso, e nada mais, o nazismo, em suas mais variadas expressões, ainda agoniza às margem das valas rasas.

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TEXTOS DE JOSÉ FUCS

Com a discussão sobre um possível flerte do presidente Jair Bolsonaro e de parte de seus apoiadores com o autoritarismo e o fascismo na ordem do dia, turbinada pelo inquérito que corre no Supremo Tribunal Federal (STF) para apurar a realização de atos considerados antidemocráticos, um novo livro dedicado ao integralismo promete esquentar ainda mais o debate sobre a questão.

Intitulado O Fascismo em Camisas Verdes - do Integralismo ao Neointegralismo, o livro vai além da história do movimento criado pelo político e escritor Plínio Salgado, em 1932, e procura relacioná-lo com o presidente, os bolsonaristas e os grupos de extrema direita que surgiram no País nos últimos anos.

Numa manobra arriscada, os historiadores Odilon Caldeira Neto e Leandro Pereira Gonçalves, professores da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) e autores de outros títulos sobre o tema, misturam acontecimentos longínquos, cuja análise é favorecida pela ação do tempo, com fatos atuais, cujos desdobramentos ainda estão por se revelar em toda a sua extensão.

Em nome da atualidade da obra, cujo lançamento da edição digital está marcado para a próxima terça-feira, eles resolveram encarar o desafio, mesmo sem ter o distanciamento que costuma permitir uma melhor compreensão dos acontecimentos históricos e do papel desempenhado por seus protagonistas.

Ao final, porém, podem ter chegado a conclusões precipitadas, ao concluir que Bolsonaro carrega os genes do integralismo e do fascismo, presentes também nos grupos neointegralistas. Mesmo levando em conta que, de um jeito ou de outro, Bolsonaro está participando do jogo democrático, eles o colocam na extrema-direita do espectro ideológico, lado a lado com os neointegralistas, defensores da mudança do regime, com a adoção do chamado Estado integral, formado por representantes de categorias profissionais, como pregava Plínio Salgado nos velhos tempos.

Para os autores do livro, Bolsonaro já deu diversas demonstrações ao longo de sua trajetória política que o afastam até do que eles classificam de direita radical e o aproximam dos integralistas e da extrema direita, como o apoio ao regime militar, o anticomunismo, o antidemocratismo e o conservadorismo na área de costumes. A crítica à "velha política", presente em seu discurso de campanha e hoje deixada de lado, em razão da aliança firmada com o Centrão, é outro ponto que reforça, na visão dos autores, sua identificação com os integralistas em seus primórdios, quando se levantavam contra as forças políticas tradicionais.

É preciso levar em conta, porém, que a política econômica liberal praticada pelo ministro Paulo Guedes pouco ou nada tem a ver com o nacionalismo e o protecionismo defendidos pelos integralistas ou neointegralistas. São, aliás, motivo de rusgas com Bolsonaro. O mesmo se pode dizer em relação à aproximação do Brasil com os Estados Unidos e com Israel, promovida pelo atual governo, alvo de críticas contundentes dos neointegralistas. Ao contrário da maior parte dos grupos que reivindicam a herança do integralismo, que sempre cultivou um sentimento antissemita, principalmente as correntes mais identificadas com o advogado e escritor cearense Gustavo Barroso, Bolsonaro também, ao que se sabe, não costuma colocar os judeus como a razão de todos os males do mundo.

Hoje em dia, o termo fascismo perdeu muito de seu significado original. Os traços autoritários de Bolsonaro e de muitos de seus seguidores podem ser observados a olho nu. Provavelmente, as ideias e as posturas de Bolsonaro tenham pontos em comum com as dos integralistas. Agora, também há divergências, que o afastam do grupo. Carimbar o presidente como fascista pode ser compreensível no jogo político, por parte de seus adversários. Agora, do ponto de vista histórico, ainda é algo que está por se confirmar.

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Em meio à percepção de que o presidente Jair Bolsonaro e parte de seus apoiadores representam uma versão tupiniquim do fascismo no século 21, que prospera entre seus adversários, um novo livro se propõe a iluminar o debate sobre o tema.

Escrito pelo jornalista Pedro Doria, colunista do Estadão, com o título Fascismo à Brasileira e lançamento marcado para esta quinta-feira, 17, em palestra virtual do autor, o livro procura avaliar as diferenças e semelhanças entre o bolsonarismo, o integralismo e o fascismo, a partir da história da Ação Integralista Brasileira (AIB) e do movimento criado em 1915 na Itália por Benito Mussolini, ditador que comandou o país com mão de ferro por 23 anos, de 1922 a 1945.

Fundada em 1932 pelo político, escritor e jornalista Plínio Salgado (1895-1975) e extinta em 1937, com a decretação do Estado Novo por Getúlio Vargas, a AIB foi uma versão nacional do movimento fascista italiano. Em seu auge, segundo Doria, chegou a ter um milhão de filiados e foi o maior movimento fascista do mundo fora da Europa e o maior grupo de direta do País, até a eleição de Bolsonaro e o surgimento do bolsonarismo.

Embora tenha a pretensão de fazer a ponte do bolsonarismo com o integralismo e o fascismo, a obra tem como ponto alto a pesquisa que Doria realizou sobre a vida e a trajetória pessoal, intelectual e política de Salgado, até hoje venerado por seus seguidores. Destacam-se também os relatos sobre a interação de Salgado, chefe absoluto do integralismo, com personalidades do País e do exterior e com correligionários que o acompanharam na construção e nas atividades da AIB - em especial, o historiador Gustavo Barroso, comandante das milícias do movimento e líder da ala antissemita, e o jurista Miguel Reale, responsável pelo Departamento de Doutrina, no qual detalhou a estrutura do que seria um Estado integralista, centrado na eleição de representantes de categorias profissionais, em linha com o corporativismo fascista.

'Galinhas verdes'

Numa narrativa envolvente, rica em detalhes, Doria conta como foi o encontro de Salgado com Mussolini, no Palazzo Venezia, em Roma, em 1930, que selou sua admiração pelo fascismo, dois anos antes da fundação da AIB. "O encontro com Mussolini foi apenas o momento histórico em que tomei a decisão", escreveu o líder integralista a um amigo, semanas depois, de acordo com o autor.

Doria relata também como foi a primeira marcha da AIB, realizada em São Paulo, em 23 de abril de 1933, quando Salgado e os demais dirigentes do movimento vestiram pela primeira vez as célebres camisas verdes, e o conflito ocorrido na Praça da Sé, também na capital paulista, em 1934, quando milhares de militantes que iriam participar de uma manifestação integralista foram recebidos à bala por apoiadores da Frente Única Antifascista, instalados em prédios da região - incidente que ficou conhecido como a "Revoada das Galinhas Verdes".

O livro traz também dois episódios pouco conhecidos da vida de Salgado. Um era a sua ligação com o banqueiro Alfredo Egydio de Souza Aranha, fundador do Banco Federal de Crédito, embrião do atual Itaú Unibanco, que foi uma espécie de mecenas para ele e pagou as despesas de sua viagem à Europa, quando se encontrou com Mussolini. O outro, a leitura de seus poemas na Semana de Arte Moderna de 1922, quando reforçou sua relação com os poetas Menotti Del Picchia e Cassiano Ricardo, com quem criaria o Movimento Verde-Amarelo, que permaneceram seus grandes amigos até a sua morte.

Estado mínimo

A ligação do integralismo e do fascismo com o bolsonarismo é tratada apenas no início do livro e no capítulo final, sem que o autor chegue a uma conclusão definitiva. Em resposta à pergunta "Bolsonaro é fascista?", Doria responde: "Depende de como se define a palavra fascista. É a única resposta possível".

Nas primeiras passagens da obra, porém, Doria afirma que "os afetos do bolsonarismo são fascistas". Também diz que Bolsonaro e sua tropa de choque formam um movimento de "extrema direita", porque "não há forças à sua direita no Congresso". Por outro lado, afirma que "Bolsonaro foi eleito" e que "esta não é uma diferença irrelevante". Diz ainda que "buscar o Estado mínimo e promover o fascismo são incompatíveis" e que "o liberalismo defendido por (Paulo) Guedes (ministro da Economia) é uma ideologia de destruição do Estado que tem por objetivo impedir que ele se torne fascista". Talvez, em meio à polarização predominante neste campo hoje no País, ficar "em cima do muro" seja um avanço.
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